Zeca Afonso ao vivo no espetáculo gravado ao vivo, em 29 de Janeiro de 1983, no Coliseu dos Recreios.
Zeca Afonso ao vivo
Zeca Afonso, como era chamado pelos amigos, é um nome essencial da música popular portuguesa e da revolução de Abril de 1974. José Afonso foi Professor, cantor, revolucionário, permanecerá para sempre como uma figura de destaque da cultura portuguesa.
ALINHAMENTO
01. Balada do Mondego
Instrumental
MÚSICA José das Neves Elyseu
02. Saudades de Coimbra LETRA Afonso de Sousa
MÚSICA Mário Maria da Fonseca
03. Senhora do Almortão LETRA/MÚSICA Popular, Beira Baixa
04. Dor na planície Instrumental
MÚSICA Octávio Sérgio
05. Balada do Outono LETRA/MÚSICA José Afonso
06. Canção de embalar LETRA/MÚSICA José Afonso
07. Natal dos simples LETRA/MÚSICA José Afonso
08. Os vampiros LETRA/MÚSICA José Afonso
09. A morte saiu à rua LETRA/MÚSICA José Afonso
10. No comboio descendente LETRA Fernando Pessoa
MÚSICA José Afonso
11. Um homem novo veio da mata LETRA/MÚSICA José Afonso
12. Milho verde LETRA/MÚSICA Popular
13. Papuça LETRA/MÚSICA José Afonso
14. Utopia LETRA/MÚSICA José Afonso
15. Venham mais cinco LETRA/MÚSICA José Afonso
16. O que faz falta LETRA/MÚSICA José Afonso
17. Grândola, vila morena LETRA/MÚSICA José Afonso
in:zecacoliseu.com.sapo.pt
Credits
Mixed By – José Fortes
Performer – António Sérgio, Durval Moreirinhas, Fausto*, Guilherme Inês, Janita Salomé, José Afonso, Júlio Pereira, Lopes De Almeida, Octávio Sérgio, Rui Castro, Rui Júnior, Rui Pato, Sérgio Mestre
Photography – Alexandre Carvalho
Producer – Eduardo Paes Mamede
(in Discogs)
«Águas das fontes calai / ó ribeiras chorai / que eu não volto a cantar…»Por um instante, a voz de Zeca estremece e emociona a plateia, onde muitos não conseguem conter as lágrimas perante a crueza premonitória deste verso, aquele que ainda hoje em primeiro lugar me ocorre de cada vez que penso nessa noite mágica de 29 de Janeiro de 1983. Raras vezes um tema musical terá sido tão perturbador para um auditório como o foi essa Balada de Outono cantada por José Afonso no palco do Coliseu dos Recreios
Despedida de Zeca Afonso aconteceu no Coliseu do Porto
Muito se fala sobre o concerto que Zeca Afonso realizou em Janeiro de 1983, no Coliseu dos Recreios, e do qual a RTP fez uma gravação vídeo que é habitualmente recuperada na altura das comemorações do 25 de Abril, mas poucos decerto saberão que o cantor viria a atuar uns meses mais tarde, no Porto, naquela que seria, de facto, a sua despedida dos palcos. Sabe-se que, nesse mesmo ano, Zeca Afonso ainda deu a cara em alguns eventos informais em Coimbra (esse facto é, de resto, mencionado por Irene Flunser Pimentel na fotobiografia do cantor recentemente editada), de que chegou até a ser gravado um disco pirata. Mas o último grande concerto foi, sem dúvida, o do Coliseu do Porto, que aconteceu a 25 de Maio de 1983 perante uma sala esgotadíssima desde há cerca de dois meses.
Avelino Tavares, promotor musical da Mundo da Canção, foi a “alma mater” do evento e não tem dúvidas de que, depois disso, não mais Zeca Afonso voltou a apresentar-se em público. “Lembro-me até de, no dia seguinte ao concerto, ter ido levar o José Afonso e a Zélia [mulher dele] à estação de Campanhã porque ele ia a Coimbra receber a medalha de honra da cidade. E, na melhor das hipóteses, o que terá havido é uma festa de estudantes em que se terão cantado uns fados”, recorda.
Para o concerto do Porto, e por exigência do cantor, todos os bilhetes foram postos à venda ao mesmo preço: 500 escudos. A procura foi enorme, a ponto, de, na altura, ter crescido o boato infundado de que haveria ingressos a serem “vendidos à mesa do café”.
“Algo de imperdível acontecera”
Durante o espetáculo, viveu-se no Coliseu uma “atmosfera emocional intensa”, que Tavares compara com a de Lisboa quatro meses antes: “Porventura com menos folclore, mas mais denso e sentido”. Paulo Esperança, que preside hoje ao Núcleo Regional do Norte da Associação José Afonso, também lá estava nessa noite única. Recorda-se de o concerto, que acabou por ser uma espécie de retrospetiva da carreira do cantor, ter terminado com a “Grândola Vila Morena” e de, já na rua, as pessoas regressarem a entoar em coro canções do reportório de Zeca Afonso. “Nenhum de nós sabia se aquele viria a ser o último concerto. Mas todos tínhamos consciência de que algo de imperdível se passara”, conta Paulo Esperança. O cantor já estava bastante debilitado (eram já claros os sinais da doença neuro-degenerativa que viria a vitimá-lo, quatro anos depois), precisou de sentar-se com alguma frequência e, para alguns coros, contou com o apoio de Sérgio Mestre, um seu habitual cúmplice. E também lá estiveram dois amigos da canção coimbrã, mais uma prova, para Avelino Tavares, de que não houve nenhum concerto em Coimbra, “caso contrário eles nunca teriam vindo cá de propósito”.
Autógrafos frustrados
Aliás, foi o estado de saúde do cantor que levou, na altura, Avelino a travar algo que já planeara: “No dia 26, fomos almoçar a um restaurante na Ribeira, com o Fanhais e outros músicos, e eu levava um saco com os LP’s todos que eu tinha dele para me autografar. Eram muitos os discos que havia para assinar e, ao ver como ele já estava, acabei por desistir. Senti que tinha de ter respeito por ele”.
Avelino Tavares chegou a ver Zeca Afonso, ao vivo, na Escola Infante D. Henrique, ainda antes do 25 de Abril, e esteve presente, no lendário concerto realizado sob alta vigilância da PIDE e que reuniu vários cantores de intervenção no Coliseu de Lisboa, em Março de 1974, quando já se pressentia o apodrecimento definitivo do Estado Novo.
Mas foi na revista “Mundo da Canção”, de que foi director e cujo primeiro número saiu em Dezembro de 1969, que Avelino Tavares mais tentou promover José Afonso, publicando-lhes as letras, bem como as de outros cantores igualmente comprometidos. Foi dele a primeira capa a cores da MC, correspondente ao número 12 (Novembro de 1970). Mais tarde, o cantor viria de novo a surgir na capa da revista, precisamente em Fevereiro de 1975, na esteira do lançamento do álbum “Coro dos Tribunais”.
Depois de muitos meses a iludir a censura com páginas em que textos de conteúdo mais político dividiam espaço com “anúncios pirosos” a depilatórios e calças de terylene, a revista acabou mesmo por ser apreendida quando saiu o número 34, por causa da existência de um suplemento dedicado às novas músicas. Só depois da revolução Avelino Tavares viria a conseguir repor em circulação os malfadados exemplares. Uma aventura editorial que durou até Junho de 1985, sempre sob a aura inspiradora de José Afonso: “Nós vamos todos desaparecer, mas ele vai ficar”.